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sábado, 21 de abril de 2012

Respira, engole o choro. Vai passar. Sempre passa.

Ela entrou pela porta do quarto, segurando o grito, escondendo as batidas de seu coração. Fechou a porta e caiu. Largou suas emoções, derrubou a tristeza e libertou as lágrimas.
Lentamente, olhou para o espelho à sua frente.
Viu-se só. Como se fosse possível, sentiu-se uma única criatura habitando todo o universo. Aquela imagem doía. Ver-se assim, tão vulnerável, fazia a menina se lembrar de sua humanidade, de seus sentimentos. Lembrou-se de cada palavra dita e de como elas eram mentirosas. De cada sorriso torto que surgia tentando disfarçar a dor. De cada olhar que tentava esconder a verdade. Sim, aquela verdade. Uma verdade que ela guardava, fielmente.
Sua imagem no espelho era cruel. Trazia à tona a lembrança de algo que deveria ser jogado fora e que permanecia ali dentro, contudo. Lembrança que abria uma ferida cada vez maior em seu coração.
Aquele momento parecia interminável. Diante do espelho, ajoelhada, a garota revelava para sua própria imagem tudo aquilo que escondeu das outras pessoas durante toda sua vida. Ali, sozinha, ela podia se entregar, deixar sua personalidade fluir e expor suas opiniões. Podia respirar, viver ou somente existir.
Tão frágil aquela menina. Era triste perceber que poucas pessoas a conheciam a esse ponto. Triste ver que poucos se importavam com o que havia por trás daquela aparência elaborada, daquele disfarce, daquela fantasia. Será que alguém algum dia desconfiara de suas reais intenções?
Ela parou. Essa dúvida já era demais. Não, impossível. Ela sempre foi muito discreta e passava despercebida quando o assunto era sua vida. Deixou essa ideia de lado e levantou. Ela sabia que a vida ia sempre aparecer com algum obstáculo, que ela iria cair; cada vez mais. Mas, a menina sabia também que poderia se levantar e começar de novo, sempre que desejasse. 
E então, ela desejou. Reuniu todas as suas forças, respirou fundo, enxugou as lágrimas e levantou. Recuperou as energias, colocou o sorriso estranho de sempre no rosto, abriu a porta e voltou para o mundo. Percebeu que por mais que ela se revelasse, os outros nunca seriam capazes de a compreender. Assim, tudo voltou a fazer sentido. Ela não era estranha por esconder seus sentimentos, não mesmo. A verdade é que cada um se defende como pode. Como quer. 
E quando outras crises vierem, que o tempo se vire e resolva. Basta respirar. Vai passar. Sempre passa.


"É sempre assim que acontece - quando a gente se revela, os outros começam a nos desconhecer" - Clarice Lispector.

sábado, 7 de abril de 2012

Relicário Vazio.

Inspirado em uma das poesias líricas de Camões.
Perdoe-me Camões, antes de tudo.
É que sofro do mal do pensamento
que há muito tempo vive em seus versos.


Não sou poeta, não sei falar e pouco escuto.
Sinto-me tão distante dessa tal de sanidade.
Por onde passo, só encontro ideias loucas e perdidas;
frias e mortas,
enchendo meu relicário vazio.


Talvez minhas palavras não sejam tão eficientes quanto as suas;
ou servirão de alerta para alguém nesse mundo.
Mas a vontade de gritar aqui não cabe mais.
Gritar, mandar embora essa racionalidade exagerada.


E aqui estou. Dizendo:
Cansei de pensar, cansei de sentir,
A partir de hoje eu só vou aguardar.
Aguardar o dia em que alguém será capaz de não me iludir.
De me curar ao invés de me ferir,
de ficar ao invés de partir,
de amar ao invés de mentir.
Vou esperar, até demais.